Brasil
do arquipélago ao continente – Integração nacional
Para analisarmos a evolução do
território utilizaremos os conceitos propostos por Milton Santos e Maria Laura Silveira
na obra “O Brasil: território e sociedade no início do sáculo XXI” (Rio de
Janeiro: Record, 2001. p.28-30)
O “meio natural” é compreendido como o
momento em que a natureza ainda comandava a maior parte das ações humanas, no
qual as técnicas e o trabalho eram totalmente associados às dádivas da
natureza. É caracterizado como o período do “tempo lento”, que se estendeu do
surgimento do homem em sociedade ao advento das máquinas. Associando a
caracterização do “meio natural” à caracterização geral do território
brasileiro, entre o século XVI e o início do XX, é possível destacar que,
durante séculos (do século XVI até 1930), o Brasil pôde ser comparado a um
“arquipélago” ou país desarticulado. 1. Povoamento: concentrado no litoral e ao
longo dos rios (influência do “meio natural”). Nas áreas mais distantes da
costa – o sertão –, uma população dispersa se ocupava da criação extensiva de
gado e culturas de subsistência. 2. Ausência de integração: as áreas econômicas
mais ativas e densamente povoadas estavam isoladas umas das outras,
comunicando-se apenas por via marítima (influência do “meio natural”). 3.
Ocupação econômica: até meados do século XX, foi estimulada, principalmente,
pela de- manda de produtos para o comércio exterior.
Entre os
exemplos de conteúdos relacionados ao “meio natural” que prevaleceu no Brasil
entre o século XVI e o início do XX, e
suas contrapartidas territoriais, cabe ressaltar e analisar: 1. Os ciclos
econômicos e a incorporação do Brasil na divisão internacional da produção
(inclusive, é interessante citar o caso da cidade de Salvador (BA) como a
primeira capital escolhida em 1549 por sua posição geográfica no “coração” de
um país desarticulado, cujo desenvolvimento ocorreu graças à primeira atividade
agrícola de peso, a cana-de-açúcar, no Recôncavo Baiano e também na zona da
Mata do Nordeste). 2. A exploração do ouro e de pedras preciosas a partir do
século XVIII, responsável pela incorporação de novas regiões à fronteira
econômica (os atuais Estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso
do Sul). 3. Como as necessidades de escoamento e de fiscalização da produção
mineral deram ao Rio de Janeiro (que se tornou a segunda capital da Colônia, em
1763, conforme refletido no mapa a) as condições de desenvolvimento, ampliadas
com a chegada da família real portuguesa, em 1808.
O “meio
técnico” surge quando o homem começa a se sobrepor ao “império da
natureza”, por intermédio da construção de sistemas técnicos. A vigência desse
meio geográfico é composta de vários subperíodos, durante os quais o território
brasileiro asilou a incorporação das máquinas (telégrafos, ferrovias, portos
etc.), de forma seletiva, caracterizando-se esse meio por desigualdades
regionais. Em âmbito mundial, o progresso técnico era geograficamente
circunscrito, instalando-se em poucos países e regiões (no caso brasileiro, um
exemplo seria São Paulo. A partir do final da II Guerra Mundial (1945) e até a
década de 1970, o “meio técnico” apresenta subperíodos de transição que
fornecerão as bases para a instalação do “meio
técnico-científico-informacional” (atual). Este se consolidará após um período
de transição, cunhado por SANTOS & SILVEIRA (2001: 28) como “período
técnico-científico”, baseado na tecnociência e caracterizado pela “revolução das
telecomunicações”, no qual ciência e técnica passam a estar intrinsecamente
ligadas, ambas regidas pelas leis do mercado , essa transição pode ser
relacionada aos grandes eixos rodoviários e à maior integração dos espaços à
economia nacional. Associando a caracterização do “meio técnico” à outra geral
do território brasileiro entre o final do século XIX e meados da década de 1940 , é possível
salientar que, no século XIX, com o desenvolvimento da economia cafeeira no
Sudeste, começou a verificar-se uma nova inflexão no processo de valorização do
território brasileiro (o que também coincide com a transição entre o “meio
natural” e o “meio técnico”). Suas principais características foram: 1. A
construção de sistemas técnicos com o surgimento de setores comerciais e
bancários, associados às novas condições de transportes e comunicações (estrada
de ferro, telégrafo e etc.). 2. A relativa integração do território que, no
início do século XX, era constatada em torno do Rio de Janeiro e de São Paulo,
mas que, no entanto, não era efetiva nas demais regiões do país, que mantinham
com aqueles centros relações tênues e esporádicas. 3. A industrialização, cujo
desenvolvimento ocorreu intensamente em São Paulo e arredores, permitindo que a
cidade e o Estado tivessem adquirido papel central na vida econômica do país.
4. A ocupação econômica que, na década de 1950, foi favorecida em virtude da
ampliação dos esforços para equipar o espaço nacional com vias de circulação e
infra- estrutura, fortalecendo as relações entre o Sudeste e as demais regiões.
5. A construção de Brasília, a nova capital do país, durante o governo de
Juscelino Kubitschek (1956-1961), marco representativo do processo de
interiorização, expandindo-o em direção ao Centro-Oeste e à Amazônia. Por
último, vale salientar que, mais uma vez, o conjunto de processos indicados
consolidou uma configuração territorial que favoreceu o Estado de São Paulo,
cuja capital firmou-se como a metrópole econômica do país .
A
Construção de Brasília Em termos estratégicos e econômicos, o governo de
Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi marcado pela elaboração e aplicação do
Plano de Metas, que estava dividido em seis grandes objetivos: energia,
transportes, alimentação, indústria de base, educação e, é claro, a construção
de Brasília, o que foi chamado de meta- síntese. Apesar da descrença
generalizada de que a nova capital fosse realmente construída, Juscelino
conseguiu aprovar no Congresso, em 19 de setembro de 1956, a Lei n.º 2.874, que
daria seguimento ao processo de construção e criaria a Companhia Urbanizadora
da Nova Capital (Novacap), responsável pela execução do projeto. Entre os
objetivos básicos para a mudança da capital, destacavam-se: obedecer à
Constituição de 1891, reafirmada pela de 1946; integrar o interior do país; gerar
empregos; ocupar parte da mão-de-obra nordestina; e promover o desenvolvimento
do interior do país, contribuindo para desafogar a Região Centro- Sul. A
construção de Brasília expressava o desejo, por parte tanto dos arquitetos e
engenheiros quanto dos políticos, de modernidade, de igualdade defendida pelo
Estado; enfim, de mudança histórica, pois o Brasil, pela primeira vez, olhava
para seu interior e não para o Oceano Atlântico e a Europa.
Por “meio
técnico-científico-informacional” pode-se entender o meio geográfico atual,
cujo surgimento ocorreu a partir da década de 1970, no qual a informação passou
a ser variável fundamental no período de globalização, de constituição de um
mercado global e de uma unicidade técnica planetária. Seu funcionamento tem
como base técnica a fusão das tecnologias da informação com as
telecomunicações, gerando as novas tecnologias da informação. Embora os dados
naturais expliquem aspectos das atuais diferenças regionais do território
brasileiro, nas últimas décadas o crescente acréscimo de ciência e tecnologia
ao território configura-se como o elemento central da diferenciação. Associando
a caracterização do “meio técnico-científico- informacional” à outra geral do
território brasileiro entre as décadas de 1970 e 1990, é possível destacar que
desde a década de 1970 o território brasileiro apresenta novas e significativas
transformações. 1. Infraestrutura e integração nacional: aproveitamento das
principais bacias hidrográficas para a produção de eletricidade; modernização
dos portos; construção de ferrovias orientadas para produtos especializados;
desenvolvimento da rede rodoviária com a construção de autopistas nos
principais eixos de circulação e de estradas vicinais, principal- mente nas
áreas de maior densidade econômica; instalação de rede de telecomunicações com
alcance em todos os municípios, viabilizando maior contato com o resto do
mundo. 2. Diversificação econômica e desconcentração industrial: a partir das
bases do desenvolvimento criadas anteriormente (sucessivos meios técnicos), a
indústria tornou-se diversificada, inclusive iniciando sua desconcentração; a
agricultura, por seu turno, se moderniza no Sul e no Sudeste e em outras
regiões, onde se destacam os Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás
e Bahia. No caso do Nordeste, a difusão da irrigação permitiu o aproveitamento
agrícola intensivo de parte de suas terras.
Nova fase de urbanização: se, por um lado, nos
primeiros 450 anos da história do Brasil, o povoamento e a urbanização foram
praticamente litorâneos, atualmente constata-se um país urbanizado, com uma
taxa de urbanização superior a 75% e diversos níveis e tipos de cidades. Fatos
semelhantes expressam que o país passa por uma nova fase da organização do
espaço e da urbanização, fundada em uma vida de relações mais extensa e mais
intensa. Desde a década de 1970, constata-se a difusão do fenômeno urbano em
todas as regiões (urbanização do território), com a multiplicação do número de
cidades locais e a criação de numerosas cidades médias em todos os Estados. Ao
mesmo tempo, há o surgimento de novas grandes cidades e o processo de
metropolização é limitado apenas no Sudeste. 4. Região concentrada: representa
a expressão mais intensa do “meio técnico- científico-informacional”, pois é a
área onde se verificam de modo contínuo os acréscimos de ciência e tecnologia
ao território. Embora sinais de modernização sejam constatados em todo o
território, essa região é formada pelos Estados do Sul e do Sudeste e por
parcelas do Centro-Oeste. Reúne o essencial da atividade econômica do país, com
São Paulo mantendo o papel de metrópole nacional, baseado em sua condição de
centro informacional e não mais como centro industrial.
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