COLASSANTI, Marina. E por falar em amor
"Outra coisa, porém, chama minha atenção nos grupos jovens que
conheço: namoram muito e não
namoram nada.
Namoram muito porque têm sempre um/a namorado/a em
campo, alguém em quem estão interessados, alguém que estão 'azarando'. Mas ao
mesmo tempo não namoram nada, porque essas relações são muito inconsistentes. O
casal se junta e se separa com a mesma facilidade. Não há amor, não há
envolvimento. Há desejo, epidérmico. Na verdade não são bem namoros, são
casualidades.
E como começam muito cedo, de uma casualidade em
outra passa-se o tempo. Agradável a princípio, excitante, uma espécie de
tiroteio cerrado de desejo, de busca, de troca. Mas cansativo a longo prazo,
desapontador. Do amor, afinal, esperavam mais do que isso.
Quando eu tinha 16 anos não se ia para a cama. Em
compensação amava-se delirantemente. Vai ver, era por isso mesmo: não indo para
a cama não se 'esvaziava' o desejo, não se matava a sede, e então, durante
meses e meses, ia-se procurar aplacá-la na boca do amado, nas mãos errantes na
acolhedora escuridão das matinês. Tirei grandes sarros no cinema, mas jamais
lhe daria esse nome - ou o equivalente na época -; dentro de mim eu era uma
heroína romântica, estava vivendo um grande amor.
Naquele tempo faltava uma coisa, hoje falta outra. Eu não podia me dar o
sexo.
Eles não conseguem se dar o amor. As moças com
quem converso me dizem que gostariam, que têm vontade de ter um namoro mais
consistente. Mas que os rapazes não querem. Será verdade? Confesso minha falha,
mãe de filhas mulheres, rodeada de sobrinhas, afilhadas, amigas, quase não
conheço rapazes aos quais fazer esse tipo de pergunta. Mas será
que eles não querem mesmo? Ou será que, como elas, querem e não conseguem? E se
ambos não conseguem, que impedimento é esse que existe entre eles e o sentimento,
logo agora que foi derrubada a barreira entre os jovens e o sexo?
A tendência imediata é achar que não param em nenhum/a
porque podem ter todos/as. Mas por outro lado existe a facilidade maior de
parar em um parceiro, agora que ele pode ser completo, reunindo sexo e
sentimento.
Se eu disser que fogem do
envolvimento porque costumam ter em casa exemplos de relação tumultuados ou
desastrosos, estarei fazendo psicologismo barato, porque a minha geração também
teve exemplos paternais nada animadores, e no entanto partiu desde cedo para a
relação.
Acontece também que são filhos diretos da baixa do
amor, do descrédito da relação, e da ênfase nas emoções tonitruantes. Enquanto
deixam o amor de lado, procuram terremotos emocionais no 'som', no 'brilho',
nos riscos.
Mas uma idéia me ocorre que me parece mais
acertada. A de que os jovens estejam, de forma inconsciente, fugindo do amor justamente porque podem ter o sexo. Explico melhor: o
amor é uma emoção importante, o sexo também; mas só o amor somado ao sexo constitui a emoção fundamental do ser humano. Ora, nem todos os jovens têm um mesmo grau de amadurecimento. E nem todos
eles se sentem prontos para chegar ao topo do seu universo emocional. Antes
todos podiam ter amor, e só os mais maduros - ou os mais inconscientes - se
lançavam na completude amor/sexo.
Agora acontece exatamente o oposto: tendo o sexo,
evitam somá-lo ao amor, adiando a sobrecarga emocional que não se sentem
capazes de enfrentar."
FONTE:
______________________
(AAVV.
Para filosofar. São Paulo: Scipione, 2002, pp. 116-117)
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