domingo, 16 de outubro de 2011

TER O SEXO TORNOU MAIS DIFÍCIL TER O AMOR


COLASSANTI, Marina. E por falar em amor
"Outra coisa, porém, chama minha atenção nos grupos jovens que conheço: namoram muito e não namoram nada.
Namoram muito porque têm sempre um/a namorado/a em campo, alguém em quem estão interessados, alguém que estão 'azarando'. Mas ao mesmo tempo não namoram nada, porque essas relações são muito inconsistentes. O casal se junta e se separa com a mesma facilidade. Não há amor, não há envolvimento. Há desejo, epidérmico. Na verdade não são bem namoros, são casualidades.
E como começam muito cedo, de uma casualidade em outra passa-se o tempo. Agradável a princípio, excitante, uma espécie de tiroteio cerrado de desejo, de busca, de troca. Mas cansativo a longo prazo, desapontador. Do amor, afinal, esperavam mais do que isso.
Quando eu tinha 16 anos não se ia para a cama. Em compensação amava-se delirantemente. Vai ver, era por isso mesmo: não indo para a cama não se 'esvaziava' o desejo, não se matava a sede, e então, durante meses e meses, ia-se procurar aplacá-la na boca do amado, nas mãos errantes na acolhedora escuridão das matinês. Tirei grandes sarros no cinema, mas jamais lhe daria esse nome - ou o equivalente na época -; dentro de mim eu era uma heroína romântica, estava vivendo um grande amor.
Naquele tempo faltava uma coisa, hoje falta outra. Eu não podia me dar o sexo.
Eles não conseguem se dar o amor. As moças com quem converso me dizem que gostariam, que têm vontade de ter um namoro mais consistente. Mas que os rapazes não querem. Será verdade? Confesso minha falha, mãe de filhas mulheres, rodeada de sobrinhas, afilhadas, amigas, quase não conheço rapazes aos quais fazer esse tipo de pergunta. Mas será que eles não querem mesmo? Ou será que, como elas, querem e não conseguem? E se ambos não conseguem, que impedimento é esse que existe entre eles e o sentimento, logo agora que foi derrubada a barreira entre os jovens e o sexo?
A tendência imediata é achar que não param em ne­nhum/a porque podem ter todos/as. Mas por outro lado existe a facilidade maior de parar em um parceiro, agora que ele pode ser completo, reunindo sexo e sentimento.
Se eu disser que fogem            do envolvimento porque costumam ter em casa exemplos de relação tumultuados ou desastrosos, estarei fazendo psicologismo barato, porque a minha geração também teve exemplos paternais nada animadores, e no entanto partiu desde cedo para a relação.
Acontece também que são filhos diretos da baixa do amor, do descrédito da relação, e da ênfase nas emoções tonitruantes. Enquanto deixam o amor de lado, procuram terremotos emocionais no 'som', no 'brilho', nos riscos.
Mas uma idéia me ocorre que me parece mais acertada. A de que os jovens estejam, de forma inconsciente, fugindo do amor justamente porque podem ter o sexo. Explico melhor: o amor é uma emoção importante, o sexo também; mas só o amor somado ao sexo constitui a emoção fundamental do ser humano. Ora, nem todos os jovens têm um mesmo grau de amadurecimento. E nem todos eles se sentem prontos para chegar ao topo do seu universo emocional. Antes todos podiam ter amor, e só os mais maduros - ou os mais inconscientes - se lançavam na completude amor/sexo.
Agora acontece exatamente o oposto: tendo o sexo, evitam somá-lo ao amor, adiando a sobrecarga emocional que não se sentem capazes de enfrentar."

FONTE: ______________________
(AAVV. Para filosofar. São Paulo: Scipione, 2002, pp. 116-117)

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